Hoje vou contar a história de um homem bom. Bom demais para ser verdade. Um homem que acreditava na igualdade entre as pessoas, se revoltava contra as injustiças e vivia todas essas coisas que os poetas, os filósofos e os políticos usam em seus discursos. Realmente não gostava de dinheiro. Era funcionário público federal concursado, ganhava bem, e se desgostava com isso. Ao receber o pagamento, ficava pensando naqueles que trabalham muito e ganham muito. Ao receber uma promoção, ficou chateado, e não aceitou o cargo que lhe ofereceram numa cidadezinha do interior, com a qual nós, seus filhos, sonhávamos acordados. O Estado lhe daria uma casa, e ele não achava isso justo.
Era um homem sisudo, as vezes rabujento, porque gostava das coisas certas. Ficava mal-humorado com freqüência, por qualquer coisa que o revoltasse, e quando chegava em casa de cara fechada, acabava-se a brincadeira das crianças. Eu perdia a inspiração para contar histórias a mim mesmo, uma mania que herdei dele.
Confesso que as vezes tinha medo dele, as vezes me revoltava, embora, felizmente, guardasse para mim a revolta. Nunca fui mal-criado, e isso salva a minha consciência. Um dia fui embora de casa e, então, parece que a minha amizade com ele se solidificou. Nos últimos dias de sua vida, esclerosado, preso a uma cama de hospital, esperava que eu, como jornalista, fosse libertá-lo. E eu, doce mentiroso, prometia que sim. Dava-lhe cigarros, escondido de minha mãe, severa guardiã de sua saúde. Se não havia recuperação, porque privá-lo do prazer? Não sei se errei, mas foi uma tentativa de generosidade da minha parte que espero que me compense pelas vezes em que me aborreci com ele.
Não sou religioso mas creio nas coisas boas que todas religiões têm. Não sei, se ao morrer, nossas almas descansam eternamente na luz ou nas trevas, conforme nossa vida pregressa, como querem os católicos; ou se voltam para nova vida, como querem os espíritas. Aonde quer que ele esteja, porém, espero que entenda minha admiração por ele, e me perdoe por não tê-lo compreendido.
quinta-feira, 7 de agosto de 2008
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