sábado, 24 de maio de 2008

Romualdo e Juliana

-“Todo mundo homenageia Juliana na janela...” Pô, tenho que parar de cantar essa isso... Mas onde está essa porcaria? Ela tá sempre comigo, nunca largo, e agora? Ontem, cheguei em casa meio de fogo, meio cansado. Na hora de tirar a camisa deve ter caído por aí. Manhê, você viu os papéis que tavam no meu bolso ontem? Não viu, porcaria... Juliana... Ah não, agora ela é Joly, J-o-l-y... Essa porcaria desse y... E é paroxítona, Joly. Com acento no ó, só que não escreve esse acento... Eu tinha uma cachorra chamada Joli, e era oxítona... Romy e Joly, que frescura... Mas onde fui botar essa papelada... A foto dela, o telefone, meu RG, o diabo... Ah, Juliana, tudo poderia ter sido diferente, você não acha? Mas você virou Joly... O culpado de tudo foi o Roberto Carlos... Mas onde diabo eu pus essa porcaria? Vai ver minha mãe viu essa papelada toda jogada e resolveu arrumar encafuada num cantinho que nem ela sabe mais... Mania de mulher... Tava no meu bolso ontem à noite... “Você precisa estudar, Romy. Você é tão inteligente”... Ela faz faculdade e eu parei no primário... Vai ver que ela tem vergonha de andar comigo... Ela secretária executiva, eu ajudante geral... Fiz um samba pra ela. Ela disse que gostou... Eu sou metido a poeta... Tinha um jeitinho de samba bossa... “Fiz um verso de amor, todo cheio de prosa”...

Ô dia difícil de passar. Romualdo não podia se concentrar no trabalho nem deixar de pensar em Juliana. Os papéis perdidos eram como um amuleto que se carrega junto aos documentos.

O amor de Romualdo e Juliana era bonito, mas não podia dar certo. Que nem a história de Romeu e Julieta. Eram de tribos diferentes. Ela granfininha, ele caipira. Ele participando de passeatas contra ditadura militar. Ela só se preocupava com bailinhos, com luz estroboscópica, com as roupas da moda. Ele nacionalista, de caipira, de Nelson Gonçalves, de Chico Buarque. Ela de Elvis Presley e yê yê yê.

Mesmo assim, ele insistia. “Não quero mais esse negócio de você longe de mim”. E ela: “sou a garota papo firme que o Roberto falou”. Era isso que estragava tudo, Roberto pra cá, Roberto pra lá. Como se o Roberto Carlos fosse coleguinha dela, um rival seu. Aí ela deu de querer ser cantora jovem e adotou o nome de Joly, e o batizou de Romy...

- Recapitulemos. Eu saí da churrascaria por volta das onze e meia da noite, tomei a lotação, que realmente estava lotada, fui em pé. O cobrador pediu moedas para facilitar o troco, elas estavam no bolsinho da camisa. Lembro-me de ter tirado toda a papelada para tirar as malditas moedas, depois... Estava muito apertado, com certeza não consegui enfiar tudo no bolsinho de novo. É perdi na lotação... Paciência... O RG eu tiro uma segunda via, amanhã eu vou na delegacia fazer um BO, o resto era papelada sem importância... A letra do sambinha, que bobagem, a foto dela eu já deveria ter rasgado há muito tempo... Juliana Spacca, você saiu definitivamente da minha vida, não quero mais esse negócio de viver sofrendo assim.

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