quinta-feira, 31 de julho de 2008

Um matuto urbano e o seu paletó

No verão de 1978, eu estava com meu amigo Nício Pinhal de Souza tomando cerveja na padaria Símbolo, que ficava na esquina rua Dom Pedro II com a Padre Celestino. Estava com camiseta de malha, bermudas e chinelos de dedo. Na época eu podia usar chinelos de dedo, porque ainda tinha o dedão do pé direito. Cerveja já não podia tomar, pois o diabetes é meu velho companheiro de jornada. Mas eu não dava importância a ele, e bebia. Eis senão quando surgem à porta do estabelecimento dois ilustres amigos meus. Um era o doutor Assis de Almeida, advogado e empresário da cidade e o outro o saudoso jornalista Onofre Leite, que valorizou intensamente a imprensa de Guarulhos e do ABC. Eles estranharam a minha situação, e perguntaram se eu não ia tomar posse na Academia Guarulhense de Letras, da qual eu e o Onofre éramos co-fundadores, ao lado de outros valorosos espíritos da cidade e cuja solenidade dar-se-ia dali a poucas horas. Eu havia me esquecido totalmente.
O Onofre morava lá mesmo, na Padre Celestino, e foi para seu apartamento enfatiotear-se. O professor Assis, por sua vez, me levou à sua casa, onde tomei banho e ali mesmo deixei a bermuda, a camiseta, a sandália e até as cuecas. O advogado se encarregou de me deixar vestido para a ocasião, dando-me o terno, a camisa, a gravata, a cueca e um belo par de sapatos.O paletó era um pouco maior do que eu, mas para quem nunca se preocupou com a aparência, como é meu caso, estava ótimo. Logo, pegamos novamente o Onofre e nós três nos dirigimos à FIG, onde a solenidade já estava preparada e o nosso atraso já estava preocupando os demais confrades.
Todo acadêmico, ao ser escolhido, escolhe um escritor conhecido para ser seu patrono. Eu, desleixado como sempre, nem havia pensado no caso. Deram-me então o nome de Vicente de Carvalho. Sorte minha, pois esse patrono foi um grande poeta paulista, natural de Santos, autor de poemas românticos, falando do amor e do mar. Sua poesia é mais conhecida, porém, é uma infantil, denominada “A Fonte e a Flor”. Além disso, o poeta foi um grande empreendedor, e criou o serviço de lanchas entre Santos e Guarujá. O bairro onde as embarcações aportam, até hoje chama-se Vicente de Carvalho.
Após trinta anos, eis que serei presidente por dois anos desse móvel sodalício, que talvez eu não soube valorizar como deveria. Vou fazer o melhor que posso.

* O texto em destaque foi suprimido da publicação no Diário de Guarulhos, devido ao espaço limitado.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Como não resolver grandes problemas

Um assunto da moda, além dos crimes de colarinho branco e da nossa inflação, é a draconiana lei seca, que visa não impedir que pessoas embriagadas dirijam perigosamente, mas punir qualquer pessoa que tome qualquer coisa alcoólica. É verdade que os índices de morte por acidente diminuiram, e parece que a maioria da população aplaude essa puritana idéia. Sou obrigado a ir contra a maré porque sou contra a inustiça.
Se a lei for levada a sério, acabam-se as festas de confraternização, encontros culturais e muita vida inteligente que tem como endereço bares e botecos da cidade. Não se nega a meritória intenção do governo ao propor tal lei, mas sabe-se que de boas intenções o inferno está cheio.
Há muito tempo, pelos mesmos princípios puritanos, alguns municípios proibiram o funcionamento de bares após as 22 horas, sob alegação que muita violência acontece em alguns botecos pela noite a dentro. Isso lembra a surradíssima piada do sujeito cuja esposa o traía em seu sofá predileto da sala. Como vingança, ele vendeu o sofá.
Outra novidade é a lei da capital que proíbe a circulação de caminhões pelo centro da cidade. Nobilíssima intenção do prefeito, pois não os congestionamentos estrangulam a cidade como a poluição mata a população indefesa. Em contrapartida, porém, o transporte encarece e o custo de vida, que já anda nas alturas, sobe mais um pouco. E o rodízio de veículos? Penaliza quem tem um carrinho e precisa dele para trabalhar enquanto os mais ricos que possuem dois carros se viram à vontade.
Problemas existem sim, e não se sabe como resolvê-los. No caso do congestionamento do trânsito e da poluição pela queima de combustíveis todos sabem a solução: seria melhorar o transporte coletivo, principalmente ferroviário e metroviário, por tração elétrica. Isso resolveria também o problema de quem gosta de bebericar à noite e poderia voltar para casa sossegado, sem ter que dirigir. É claro que isso não pode ser feito da noite para o dia.
Qual a solução a curto prazo? Se algum candidato disser que a tem, não vote nele, que é mentiroso. O que não vale é arrumar soluções que não valem nada e que prejudicam uma parcela da população.